A bem da verdade, já não era sexta-feira e sim, madrugada de sábado. Fazia calor, o rio exalava um cheiro acre, e naquele bar, onde quase todos se conheciam, ele, que a poucos conhecia, tocava.
Não era bonito. Camisa em desalinho, sem gravata, calça social, sapato horrível, paletó esquecido numa cadeira qualquer. Viera de um casamento. E tocava como um deus. Um deus tropical, trôpego e lascivo, com olhos de anjo, boca e mãos de cafajeste.
À saída, beijou-a sem pedir licença. Longamente. A ela, que não o conhecia. Depois, olhou-a nos olhos e disse que tanto a esperara. Ela riu. Conversa fiada, pensou. Nada disse. Deixou que a beijasse de novo antes de partir.
Amanhecera. O calor aumentara. O hálito do rio sossegara. Os amigos se entreolhavam. Ninguém entendera nada. Nem ela. Mas os dias nunca mais foram banais como antes.
Márcia Maia
Márcia Maia
4 comentários:
Já comentei este soberbo miniconto em teu blog.
Um enredo envolto em sensualidade e sonoridades tropicais.
Pra dar um basta em nossos dias banais...
Beijão.
Ricardo Mainieri
uma delícia!
Delicately woven words.. Nice piece!
Creio que, lá bem no fundo, todos transportamos a secreta disponibilidade para que um dia nos aconteça uma história destas. Talvez seja o prolongamento da magia dos contos de fadas...
beijo :)
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