sábado, 7 de julho de 2012

Cronicazinha Inútil


Homem carregando fardo - Goya

Não sabia que era tão difícil ser gente grande. Se o soubesse antes, pediria para ficar miúdo; menino entre os outros a correr atrás de sonhos e bolhas de sabão. Rabiscando mil palavras ocultas em códigos inexplicáveis no chão de terra do quintal dos fundos. Pediria para permanecer menino, brincando de esconder nos quintais vizinhos; roubando frutas frescas nos eternos pomares de minha infância.

Se soubesse o quão angustiante é ser homem feito, pediria pra continuar um calça-curta a jogar bolas-de-gude e soltar pipas; a cobrir a cabeça com o cobertor por ter medo de escuro e, descobrir-me repentinamente, devido o escuro também estar dentro dele. Pediria para todo homem ser menino. Que os amigos nunca se afastassem. Que a vida nunca fugisse de nosso domínio. Que todos os dias fossem domingo, ou feriado, ou dia santo, para poder brincar na praça, ver a banda passar. Que todas as festas fossem de congado ou marujada, reizado ou folia. Que todas as manhãs fossem de sol com chuvas leves à tardinha. Que todo o tempo fosse primavera, enfim.

Ah! Se eu soubesse como é ser grande e nos ombros um fardo a carregar. Se eu soubesse como é ser homem e suportar a dor de viver. Pediria eternas manhãs de canários, bem-te-vis e pintassilgos. Insistiria em meus tempos de moleque a andar no mato e ver o sol no primeiro instante da aurora avermelhando as montanhas que circundam o meu lugar primeiro. E, não amargaria estas noites de insônia na distância dos dias, sendo corroído por essa melancoliazinha latente a que chamamos saudade.

Um comentário:

Bella Fowl disse...

De vez em quando nos damos conta do tempo, o maior dos irônicos. Consegue ser o tipo que nos faz querer que passe rápido quando nos irritamos um pouco com a vida. Vai, vai logo... Mas quando segue, a gente tenta puxar de volta. Grita e implora. Mas ele volta? Que nada. Deve rir lá na frente. Falar baixinho que isso é bem feito! É pra aprender a valorizar. Mas aprendemos? Puf! Nem de longe. Repetimos o erro, uma, duas, três vezes... e mais, até. Nem dá pra contar. Burros, ele deve acusar. Discordo e grito logo. Na verdade, somos mesmo crianças!

Um trecho que escrevi há um tempo, e que me recordei lendo essa crônica sensível e cheia de doce para prender o leitor. Belas palavras e parabéns pelas metáforas tão presentes no texto. Tive o prazer de viajar para o passado por um tempo e me lembrar da minha infância de cidade quase grande.

http://bella-fowl.blogspot.com.br