O que deixo da vida há-de ter um dia DATA-VALOR?
quinta-feira, 30 de janeiro de 2014
terça-feira, 28 de janeiro de 2014
era uma noite de lua cheia. parei o
carro na estrada, para vê-la nascer rotunda,volumosa. não esquecia
da notícia de que ele tinha ligado pra mim. voltei pra casa, olhei
cada um de meus parentes. entrei debaixo do chuveiro pensando: logo
mais, no telefone, ouvirei pela primeira vez a voz de meu pai.
domingo, 26 de janeiro de 2014
Meu Deus é o Sol
Não consigo acreditar em Deus,
nesse velhinho moralista me vigiando lá de cima, tomando conta do meu corpo com
cara feia. Não dá. Meu deus é energia, cara, é a vida, a cadeia alimentar, a
Lei da Gravidade. É o Sol.
...
Bom, se ele é o Sol, eu prefiro
ficar afastado de Deus em dias quentes.
sexta-feira, 24 de janeiro de 2014
Genealogia
Para Eduardo Martins Nolli Duarte
As
raízes
1
Descendo
de uma linhagem de homens
que eram
chamados
pelo nome do rio mais próximo
Como
ela, mantinham-se íntegros,
enfeitá-los
com códigos
de barra
& impor tarifas de exportação .
brotava
do seio de uma máquina
que subjugava o solo
esvaziando
o conteúdo que
ele escondia
fervilhando
nos rugidos
das onças
no assovio do vento .
os
inimigos
que
nos massacrava, violentava,
respondiam
de prontidão .
o
sangue na mão
compartilhado nos
2
Eu
estava entre os portugueses
ensinei
aos índios o beijo
que apodrecia a boca
&
que corroia os dentes
–
o
abraço que
desfigurava as carnes
(que deixa em rubor toda a técnica
transformando
sua água
em sangue ,
cobrindo
os leitos com
cadáveres , era
pouco .
e
envenenava as crianças –
3
Descendo
de mulheres
o segredo
da cura .
Sabiam
extrair da menor
partícula da mata
a
verdade sobre
o todo .
Contemplaram
um dia ,
na face da água ,
uma
terra desolada que
não prestava
o
filho de seus
ventres esterilizando o chão
havia
sido decretada a era do estupro .
4
e
viviam apenas do que
precisavam.
E
assassinar nunca
fora problema
& na cruz
o álibi .
5
Um
selvagem impressionado
o
homem de quem
descendo
tremendo
ao ver a ponte
(pouco antes
temera o oceano
Margareth
Tacher agradece.
6
Descendo
de uma linhagem de homens escuros como o asfalto, velozes como os carros:
homens que foram assassinados em suas pátrias e trazidos para cá, para comerem
a areia da praia e se tornarem donos de dores não-catalogadas.
Os
que ficaram pelo caminho foram estraçalhados pelas lâminas dos corais, viajaram
pelo intestino de tubarões, sedimentaram seus sonhos junto ao assoalho
encharcado do mar.
Foram
lançados de navios como carne podre: mulheres, homens, crianças, reis, heróis entregues
ao dorso suado do oceano e suas milhares de garras.
Para
futuro semelhante foram arrastados os que a travessia preservou:
–
para cultivar os bigodes dos coronéis
–
para manterem impecável a fazenda das mocinhas
–
para financiar os estudos em Paris ou Coimbra
de
vagabundos jovens advogados.
A
língua que colocaram em suas bocas não podia ser entendida pelos seus deuses,
enfurnado no alto-demais das nuvens – pululavam jesuítas com seu livro que
pesava uma tonelada.
Aqui
ficaram sozinhos os homens de quem descendo: a solidão que havia era a mesma de
todo lugar – eles apenas a aperfeiçoaram.
quinta-feira, 23 de janeiro de 2014
domingo, 12 de janeiro de 2014
Espaço
- Eu preencho meus dias com ela.
- E quando ela vai embora você fica com um buraco,
vazio.
- Não é que eu fique vazio, eu guardo espaço para
quando ela voltar.
sábado, 11 de janeiro de 2014
Grave
Silabas tônicas atônitas
acentos em estado agudo
versos quebrados
poesia muda
Joakim Antonio
Imagem: Death Is Grand by Xercism
quinta-feira, 9 de janeiro de 2014
OLHOS NOS OLHOS - Para se ler ouvindo o Chico...
"(...)Tantas águas rolaram,
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você."
Já estava na porta da loja, quando me dei conta. Dois passos curiosos e olhei em volta. Um moço organizava qualquer coisa, cumprimentei-o e perguntei.
- O "Martim" está?
-Está sim, quer falar com ele? Vou chamar.
Me olhou de cima a baixo rapidamente e sumiu por uma pequena entrada lateral. Esperei, em pé mesmo, olhando alguns anúncios e objetos decorativos do balcão, mas sem me atrever a tocar em nada, meu jeito desajeitado já havia proporcionado vergonhas demais. "Não toque em nada!" me autopoliciava como se faz com uma criança.
Surpreso, foi assim que recebeu minha presença ali, os mais de 500 km eram apenas um detalhe entre as tantas coisas que hoje nos distanciavam.
- Ah, você ainda está viva?
- Sim, estou bem viva.
- E o que faz por aqui, passeando?
-Não, vim participar de um evento, na UFC...
-Ah, sim, os seus congressos, tinha esquecido. Vamos sentar, conversar em pé não dá.
Apontou para um sofá preto no canto esquerdo. Sentamos e o lugar era muito melhor, mais ventilado.
- Quer alguma coisa? Café, água...
- Não, obrigada.
- Enfim, como estáo as coisas por Parnamirim? Tudo bem com a família?
- Está tudo bem sim, do mesmo jeito de sempre. E com a sua?
-Também na mesma. Veio sozinha?
-Não, com um pessoal do curso...
- Meu pai até hoje pergunta por você, imagine só!
- [risos] Eu adoro aquele velho! Diga que mandei um abraço e que talvez eu vá visitá-lo qualquer dia.
De vez em quando olhava para a porta e eu acompanhava seu olhar, até que não me contive:
- Esperando alguém? Se estiver, desculpe, não quero atrapalhar...
- Ninguém, coisas do trabalho. Muita coisa, agora é assim.
Uma das coisas que sempre nos distinguiu foi a ambição. Eu sempre tive sonhos, planos e projetos de crescimento, ele não. Minhas preocupações com futuro, boa formação profissional não o agradavam, eu queria o melhor, não só pra mim, e tentava fazer-me fortaleza e apoio, dizia que ele não deveria se resumir àquilo que a realidade imediata oferece, mas ir além. Lembro que ele respondia me fazendo qualquer carinho e me chamava de sonhadora.
- E aí, já está perto de casar?
- Eu? Claro que não, ainda tenho juízo! [risos] E você?
- Também não, agora sou um solitário.
- Ah, espero que logo apareça alguém.
- Espera mesmo?
Que perguntinha mais pretensiosa, pensei, talvez ache que ainda padeço com todo aquele passionalismo de tempos atrás. Ouvia cada palavra com atenção, adivinhava-as acintosas, maldosas, pareciam atravessadas por um certo rancor. Eu olhava para o passado e não entendia seus motivos, pois, no fim das contas, todas as atitudes que fizeram as coisas se desencaminharem foram tomadas por ele, disso não guardo nenhum remorso.
- Espero sim, acho que todo mundo precisa de alguém.
- E você já tem alguém?
-Não, mas nem estou apressada, um dia terei.
Ele sorriu, e a isso não consegui responder.
Quando entrei na loja, não sabia nem pra quê estava indo ali, mas desde quando me arrumara, parecia ter as coisas muito bem definidas, seja na frente do espelho, indecisa entre cabelo preso ou cabelo solto ou na escolha da vestimenta: jeans ou vestido? Fiquei com a segunda opção. Apesar de não estar acostumada a usá-los, sempre achei os vestidos bem mais femininos - leve, marcado na cintura e com um bom decote, não tão curto, mas também não tão longo, suficientemente revelador, que lhe saltasse aos olhos. Provocaria-o com uma aparição inesperada. Nada de saudade ou intenção de reconquista, mas um momento muito apreciado pelas mulheres: o de mostrar que está melhor, e muito, sem ele.
E então vi que era hora de me despedir, a conversava ultrapassava os limites da tensão que parecia estar sob controle no início e eu não queria que chegasse ao ponto de ser interrogada sobre novos amores, paixões ou coisas de que ele soubera ou lera. Não que acreditasse que ele ainda sentisse algo por mim, mas ele sabia ser desagradável quando queria, todo mundo sabe.
Ainda teria que sair com algumas colegas, justifiquei. Levantou-se e me acompanhou até a saída, sem nenhum contato mais direto.
-Cuide-se, quero receber boas notícias suas!
-Você também. E a formatura, quando vai ser?
-Em março.
-Vai ter mesmo festa?
-Vai sim...
-É uma data importante, se eu puder, apareço. Até lá aviso.
-Ok. Tchau!
Atravessei a rua quase correndo e segurando a barra do vestido que um vento safado insistia em agitar. Lá do outro lado eu o vi ainda na porta, acenei e sorri. Meu coração não disparou - estava livre, finalmente. Segui andando.
terça-feira, 7 de janeiro de 2014
Renúncia
Destituo-me de
qualquer titulo,
Entrego-te a pena
para que faças dela o que quiseres,
Não sou o que
imaginas, tampouco o que desejas,
Sou um aluado
devaneando sonhos!
Renego qualquer
herança,
Os rabiscos nos muros
são mais sinceros,
Mais honestos, mais
poéticos,
Estas palavras, aqui
rabiscadas, nada valem.
Servem apenas de
muleta onde escoro meu corpo fatigado
Tentando
equilibrar-me sobre as pernas que já não andam!
Meu rótulo é a
cortina cerrada,
É o final da cena, o
aniquilamento no escuro das coisas!
quarta-feira, 1 de janeiro de 2014
caixa de skinner
as manhãs são compartimentos
hermeticamente fechados
onde não conseguirei o que quero
carrego uma subjetiva ogiva
em meu estômago que explode
nos discursos que vomito
em ouvidos surdos
quem há de me ouvir no front
se todos os símios em linhas
ignoram o verbo fundo
e o sistema está entregue
a quem desistiu de revoluções
feliz de Che assassinado antes
e não há um click mágico
para tirar do transe
abrir os olhos
ou desfazer o silêncio
a inutilidade da palavra reforça
a frivolidade do verbo
quis que por detrás
de alguma porta
existisse a parte que nos falta
se é que nos falta algo
somos apenas reféns do excesso
autarquia da inércia
pregando a sanidade
e fotografias austeras e sorridentes
nas paredes da sala de estar
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