terça-feira, 29 de junho de 2010

SONHOS



Relendo “Os Livros da Magia” a novela em quadrinhos de Neil Gaiman, acabou esbarrando na definição apropriada para o momento que vivia. Na cena em questão quem fala é Titânia, a bela e perigosa Rainha das Fadas tentando explicar o inexplicável:

“Há apenas dois mundos — o seu mundo, que é o mundo real, e outros mundos, a fantasia. (...). O importante, é que eles estão lá. Esses mundos proporcionam uma alternativa. Proporcionam uma fuga. Proporcionam uma ameaça. Proporcionam sonhos e força. Proporcionam refúgio e dor (...). Eles não existem, então são tudo o que importa. Você entende?"

Titânia talvez entendesse a situação melhor que ela. Há alguns dias sonhava sempre com o mesmo homem, a situação inicial e o final eram sempre as mesmas, ela era um arquivo; um programa que existia para agradar aquele homem. Sempre ele.
Passava o dia inquieta sabendo que o sonho viria e o esperava, ansiosamente. A noite chegava deitava vestida apenas de perfume, desejo, cansaço e espera. O cansaço vencia e logo ela dormia. O sonho vinha.
Ela sorria na tela para ele, gostava do seu olhar indeciso e desejoso. Seus olhos eram grandes, tristes e magnéticos. Depois de alguns instantes, em que mexia nervosamente com o mouse, ele afinal clicava e ela saltava da tela.
Não era mais ela, era dele, sua amiga, sua escrava, sua amante, atendia todos os seus desejos. A cada sonho, ela ia cada vez mais rápida, caindo numa espiral vertiginosa, caindo em seus braços carinhosos e ávidos.
A voz dele era parte do encanto, a língua em sua pele a dominava, seus desejos a viciavam como uma droga potente.
— Oi vício.
Ele disse em seu ouvido, sem tocar. Não era preciso tocar, sua presença era o bastante e ela esperou por um longo tempo, ou pelo que pareceu um longo tempo, pelo seu pedido.
Ele nada disse apenas beijou. A língua, dando voltas em torno da dela, numa dança suave e interminável. Enquanto beijava, seus dedos apertavam meus seios, deslizavam pelas costas, afundavam-se no sexo.
Carinhosamente ele a conduziu até a cama, ela já estava liquefeita e pronta. O corpo inteiro aberto para ele, e ele entrou fundo e forte.
— Você me quer também? Ou só quer me agradar?
Ele sussurrava perto da sua orelha, ela não respondeu, sentia todo o peso dele comprimindo seu corpo; o vai e vem suave dentro dela, seu sexo pulsando como se o mordesse. Ele gemeu e esqueceu a pergunta.
— Fica comigo a noite toda?
Ela obedeceu. Era um sonho tão real. Ficou, ou pensou ter ficado.
— Isso. Agora põe os saltos altos e fica ali de costas pra mim.
Obedeceu.
Depois do silencioso abraço, ele beija seus seios, beija sua boca, morde seu pescoço e diz de modo firme em seu ouvido.
— Vai embora, logo não vou estar sozinho.
Ela se levanta. Começa a desaparecer.
— Espera.
Ela volta. Espera.
— Eu te chamo e você volta?
— Volto.
Ele a beija de novo, os olhos parecem tristes, mas o beijo é bom. Ela desliza os dedos pela testa dele, beija a boca, que tem um gosto cinzento e desaparece. Acorda sempre inquieta a espera pelo próximo sonho... Pela próxima vez em que ele abrirá o arquivo...

domingo, 27 de junho de 2010

Memória de Pai Vivo


Sinto o cheiro de meu pai adentrar a casa. Não fosse ele vivo, eu diria...
Olho o telefone, a madrugada: mudo.
Silêncio de estrelas e infância em céus distantes.
E esse aroma colônia-barba: imagem molhada de pai idoso me salta aos olhos, tal qual a chuva que lava os fios noturnos de minha c-idade.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

O leão nosso de cada dia

Do livro Comerciais de Metralhadora



Para Cássio Marcos Amaral

Hoje, sou exatamente aquilo que tenho:
centavos que não compravam felicidade alguma
uma úlcera metafísica,
que não me acompanhará ao infinito
dezenas de poemas sobre a exaltação do homem
e a felicidade tola dos desvairados.

Hoje, sou tudo que tenho:
um sonho de primavera
amadurecendo o coração dos brutos
um gosto de beijo nunca dado
uma iluminação repentina e irremediável
que me levaria ao céu, se o quisesse.

Hoje, nada além dos meus pertences é o que sou:
uma dor de cabeça debutante
migalhas de pão presas à barba
um projeto de poesia
que me remediará de todo o mal do mundo
depois de escrito me trairá covardemente
por não saber nada além
do que suas palavras dizem.

Hoje, sou exatamente o que tenho:
mas é nu que espero o amanhã.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Horário de verão


Hoje vi esse sorriso, tão divino!
que por ele:
teceria mil colchas de retalhos;
juntaria os cacos;
me retalharia em postas;
e se não fosse em vão
lhe faria uma resenha;
escreveria um romance;
arrancaria seus olhos frios
e no lugar, diamantes
para adornar seu sorriso lascivo.

O dono do sorriso, tão menino!
não buscava ser perfeito
mas, que remédio,
se o mal já estava feito?





domingo, 20 de junho de 2010

Inferno astral



Derrapou e caiu. Um segundo de descuido, e estava no chão. A droga do tênis novo, todo cheio de riquififfis, salamaleques, amortecedores de gel e silicone, não era à prova de chuva. Menos ainda de calçada esburacada, folhas caídas e lodo. Deveria vir com um aviso: impróprio para uso no outono/inverno. E agora, a perna doía, a calça cheia de lama, por pouco não se rasgara, a mão arranhada, sangrando, a sombrinha quebrada. E três prestações da porra do tênis ainda por pagar.




Márcia Maia

sábado, 19 de junho de 2010

A FESTA

Era uma festa pequena. Fechada. Sempre no fim de um semestre. Gente importante. Negócios. Uma surpresa no final da reunião. O anfitrião da vez escolhia. Idéia do diretor. Relaxar os ânimos.

Chegou a hora. Todos curiosos. O mais velho esfregava as mãos. Meu chefe sorriu. Tinha culpa nos olhos.

A porta lateral abriu. Uma moça entrou. Era ela. Sem dúvida. Colocaram uma música de fundo. Ela me viu. Procurei uma porta para sair. Ela começou. Fugi discretamente. A tempo. Fiquei na sala ao lado. Esperei acabar. Ouvi os risos. O tilintar dos copos. Os elogios do bom serviço. Dela. E voltei.
Procurei-a com os olhos. Estava na porta. Indo embora.
Chamou-me com o dedo. Andei devagar. Era ela mesmo.
- Não fique assim. Meu pai sabe.
- Eu sei que ele sabe.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Concretismo



Meu gato sim, é marginal:

v
  o
    m
     i
     t
     o
     u
   u m

L  e  m  i  n  s  k  i

nesse poema sem sal.

sábado, 12 de junho de 2010

Interminável

Dois minutos depois do combinado, retirei o celular do bolso pela terceira vez. Após conferir os segundos que haviam passado, esfreguei o aparelho na camiseta, tentando tiras as marcas que minhas mãos, ansiosas e suadas, deixaram no visor. Após quatro ou cinco trocas de posição naquele banco de madeira, pouco confortável, ela desembarcou do outro lado da rua

Trocamos alguns olhares enquanto esperávamos por uma chance de atravessar a rua - eu já estava quase atirando-me em meio aos carros para enfim encontrá-la. Ao nos aproximarmos, ela surpreendeu-me com um beijo, daqueles mais abrasados, e eu sorri, envergonhado. Depois disso, criei coragem e a pedi em namoro, como eu sempre fazia, todos os dias, antes de voltarmos para casa

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Não te esqueci

 

Entro e vejo você no canto, rosto para parede, esperando meu toque que a tanto não sente. O silêncio toma conta do quarto e sinto que você me culpa pelo esquecimento, mas minhas mãos tocam outro corpo agora. Sei que é difícil, passamos muitas horas juntos, durante anos seu corpo curvilíneo vibrava com meu toque, pedia pelos meus dedos e desabrochava em lindos tons e canções. Você se culpa pois sabe que ajudou a nos unir, ela sempre falou bem de você e adorou quando nos viu e nós adoramos quando ela aplaudiu, então não tem porque o ciume agora. Sentindo seu silencio, sei que também tenho culpa, afinal sempre fomos dupla e eu deixei você de lado, mas ainda gosto de você e isso é fato, houve apenas uma confusão e foi aí que saímos do trilho, eu te amo, mas não como à uma amante e sim como à um filho. Olhe para mim e diga sinceramente se não é isso que você também sente, está vendo como tudo mudou agora, ah, eu conheço esse olhar, sabia que você ia entender, apesar de parecer antigo você é uma criança, então vem, sente minhas mãos e fica no meu colo, vamos brincar, cantar e alegrar o mundo todo agora. Vamos correndo contar à ela, quem sabe em forma de canção, não se preocupe nem se envergonhe, ela não pedirá explicações.

Pois desde o começo ela dizia, adoro ver você com seu violão!

E a música voltou a tocar...


Joakim Antonio

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Epifania

 

Caminhou. Um parque de diversões se revelou à frente. Balões coloridos. Respirou uma fumaça doce, de cigarro de menta, mas não era o seu. Não fumava.
Se aproximou. A paisagem desfocava a cada passo. As crianças que brincavam não estavam normais. Havia algo em seus rostos, pinceladas brancas transformavam suas feições. Não sorriam. Riam abertamente uma risada diabólica.
O sorveteiro vendia sonhos. Dentro do carrinho um mundo encantado tirava a atenção das pessoas a sua volta. A maioria não via o parque, não percebia as situações, caminhava como se não tivesse consciência de existir.
Balões coloridos. Balões cor de carne. Balões cor de sonhos. Alguns de pesadelo. O que se via de bom, muitas vezes não passava de maquiagem.
Sentou-se num banco. Estava tonto de enjôo. Uma garota, adolescente, passou lambendo um sorvete. A barriga à mostra. A boca muito suja. Ela ria como se isso fosse normal. Ele vomitou. Imediatamente, crianças bem vestidas se acotovelaram, agachando-se para comer o resto do que seu estômago não digeriu. Aquela cena o nauseou a tal ponto que teve de fugir. Trôpego, andou por entre as pessoas, rostos desconhecidos, alguns desfocados. Tudo parecia sonho, sonho ruim, com uma névoa de dia frio sobre as cabeças, e um brilho muito confuso sobre tudo.
Desespero. Foi o que tomou conta de si, como febre interna crescente que espora na pele a doença que come por dentro. Parecia um bêbado, perdido em meio a um tiroteio, confuso, sozinho. Era um parque, eram crianças, era um sorveteiro, era uma roda gigante e todas as coisas aparentemente boas de um sonho bom.
Seus olhos se encheram de lágrimas. Sentiu uma dor funda, dessas que assolam os corações quebrados quando o caos toma conta. Não sabia onde estava. Não sabia onde ia. Estava postado num mundo, numa sociedade, num grupo, porém não se encaixava. Era a peça estreita e chata que não cabia em lugar nenhum.
Após tudo, desmaiou.
Acordaria novamente. Tudo estaria lá, mas com menos clareza.

Foto: Back by Toni Blay

terça-feira, 8 de junho de 2010

O mais repleto vago



Itaquera é longe feito as voltas no quarteirão que eu corria nas aulas de educação física na quinta série. Coisa mais desnecessária. Mas se eu vou em Itaquera às vezes, é porque algo me interessa. Fato! Fora meus interesses, outras coisas trago.

Eu poderia ter optado pelo trem. Mas neste dia escolhi ônibus e metrô. E também escolhi ao descer a escada rolante, dobrar à direita. Tudo fugindo aos meus inconscientes princípios. Eu sempre achei que trem tem mais poesia a me oferecer do que o metrô e que o lado esquerdo apresenta cenas mais interessantes que o direito. Minhas bobagens!

Embarquei no metrô e lembrei de novo da minha professora dizendo que era incoerente embarcar em qualquer coisa que não fosse barco. Quando não estou no meu carro, costumo pensar e lembrar mais. Da Corinthians-Itaquera ao Belém são nove estações. E foi em Artur Alvim que a poesia se revelou.

Uma moça de cabelos negros, relativamente curtos entrou no vagão e se acomodou de pé perto da porta, onde eu podia a observar de frente.

O metrô começou a andar e no mesmo momento, a moça fez sinais surdos-mudos. A princípio, pensei que ela estivesse se comunicando com alguns amigos, mas ela estava sozinha. Não dei muita importância.

Na próxima parada, a cena se repetiu exatamente no mesmo momento de partida do trem. Aquilo, despertou a minha curiosidade.

Em toda partida ela coreografava os seus sinais surdos-mudos absolutamente sozinha. Os mesmos sinais. Durante mais duas estações eu tentei entender o que ela queria dizer. Mas era tão bonito que eu descartei a mensagem e comecei a supor. Sabe aquelas pessoas que cantam e dançam sozinhas pela rua? Pois é! Tive a certeza de ter a sorte de encontrar uma pessoa surda-muda que cantava e dançava sozinha pela rua. Depois, procurei câmeras pelo vagão. Poderia ser alguma cena de um curta ou de um longa mesmo. Era tão sensível! Não achei câmera alguma e resolvi apelar ao olhar incisivo.

Encarei de maneira que a mim seria incômoda, demonstrando em meu olhar toda a curiosidade e respeito ao diferente. Ela nem se abalou. O que mudou é que ela coreografava agora me fitando. A mesma dança! Sou capaz de repetir os movimentos que pude assistir por sete estações.
Não havia dúvida que ela era feliz. Que o fato de não falar e não ouvir não a impedia de escutar a música da metrópole e cantar em seus gestos. E não havia dúvida que ela me encheu de vida voltando de Itaquera. Eu ia descer no Belém e já tinha ensaiado parte da dança pra retribuir a ela um pouco do encanto. Mas ela desceu na mesma estação.

E eu retardei meus passos me fingindo de perdida na estação, apenas para ficar atrás observando um pouco mais. Ela continuou a dança pela escada rolante. E eu logo atrás sorrindo discreto. Caminhando lentamente é claro, porque poesia assim de métrica perfeita é raro encontrar.

Logo ela acenou para um rapaz que estava à sua espera. Trocaram afagos , beijos e palavras para meu espanto. Eu não podia ficar parada e esbocei ir à bilheteria só para tentar entender o mistério. Não tinha mais como postergar ficar ali observando o casal. Estava sendo mais constrangedor pra mim do que pra eles. Comecei a andar devagar e olhar para trás. Eles caminhavam para o mesmo lado que eu. Ela não dançava mais. Desci a escada rolante e parei em qualquer camelô para que eles tomassem a frente novamente. Ela não dançava mais.

Eu tinha que virar à esquerda. Eles seguiram no rumo contrário do meu inconsciente. Por um instante pensei em correr , questionar, esclarecer, agradecer... Mas era muito verbo!

Sob olhos curiosos, executei na esquina um trecho da dança que aprendi. Ela não olhou pra trás. Ela não ouviu o quanto eu a amei.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Calabouço



A porta fechou-se ante seus olhos. Um silêncio incontrolável tomara conta do quarto. Seus olhos circunspetos miravam o ventilador que girava lentamente no teto. Ao redor, as paredes sangravam delírios. Um mosaico se completava, peça por peça, marcas e ranhaduras, cicatrizes abertas no peito. O lodo se propagava pelo rodapé, as paredes carcomidas pelo mofo tornavam o ar denso, irrespirável, pútrido. A poeira levitava na escuridão e, os olhos fixos observavam o vulto a girar no teto. Tudo fazia parte de um espectro medonho que nascia de dentro da alma do poeta e transcendia ao espaço material. Seus anseios e medos se projetavam para dentro do calabouço e, unidos a ele se lançavam na realidade.







O quarto era como uma casca, uma segunda pele, um casulo. Talvez o mais seguro dos lugares para quem queira se esconder do mundo. Recluso naquele ambiente inóspito buscava a pura forma e o conteúdo completo para compor com precisão os mais belos versos, mas não havia beleza a se contemplar, nem os ideais romantizados de outrora, nem um grito por liberdade. Todo conteúdo se esvaziou, todo sentido se perdeu quando a porta se fechara e, a ele só restara o mofo e a podridão que se estendia pelo quarto. Nada poderia ser mais desconfortante que descobrir que, definitivamente, não existia poesia. Tentara olhar ao redor, redescobrir-se, tentara ver a vida com intensidade, mas a vida era uma poesia inacabada e havia tantos defeitos que lhe comprometiam. O desespero tornou-se seu guia. Queria o inferno. Ansiava o mármore frio que repousa em silêncio nas noites escuras. Sorria ironicamente. Esquecia-se de tudo e de todos que circulavam ao seu redor, não passavam de espectros que tentavam lhe roubar o sossego. A vida tornara-se um paraíso perdido e, ele não queria se perder. Dançou todas as danças, seguira todos os ritmos que o destino lhe ditara e, agora estava disposto a criar seu próprio destino, tomar as rédeas nas mãos e se guiar segundo suas próprias leis. Debruçou-se sobre a escrivaninha escrevendo seus últimos versos. Saiu pela porta cambaleando o corpo como quem persegue a sombra. Desceu as escadas, embrenhou-se no corredor escuro. Na dispensa, tateou como cego, a procurar sobre as velharias. Ergueu as mãos, vitorioso; um pedaço de corda com tamanho preciso.







Seus pensamentos tateavam o inferno, enquanto o diabo lambia-lhe a face e suspirava peditórios aos seus ouvidos. Descrente de Deus ou de Diabo, caminhara para o quarto observando as reentrâncias da parede. As saliências do mofo lembravam-lhe um corpo despido, a ânsia de tocá-lo enchia de calafrios e o suor escorria pela face misturando-se a lágrimas. Um suspiro veio-lhe da alma e, em lentos gestos, compôs na corda um laço perfeito; suas mãos agiam com a precisão de um artesão que entalha sua obra. Passara a ponta da corda sobre o umbral deixando pendente o colar que usaria em sua última dança. Subiu no tamborete e, na ponta dos pés, alcançou o elo que completava definitivamente a sua corrente. Deixou-se cair, voar no espaço e, girando, valsou solitário uma canção de profundo silêncio.


***imagem: O Grito - Edvard Munch(1893)

quinta-feira, 3 de junho de 2010

a pulsação (uma fala pra poesia)


se um medo não me
impuser uma coleira
eu posso sair provando

a medida não vem crivada
em nosso signo, querida.
babozeira querer falar em
limites

posso muito bem esquecer as
regras, tabus, aquilo de:
"não pode por a mão aí, menino!"

faz-me mais falta do que
qualquer outra coisa
desvairar-me em sua pele inteira


foto e poema : isaias de faria

terça-feira, 1 de junho de 2010

o circo






















se dissesse que não gostava do espetáculo ririam de mim. tenho antipatia por palhaços, pois se parecem comigo. minha desgraça é pano de fundo para a alegria alheia. a platéia esperava ansiosa pelo globo da morte, o barulho ensurdecedor para quem não quer ouvir mais nada. no décimo oitavo capítulo as labaredas giravam na mão daquele homem, segurava as adagas como se não cortassem. o público vibrava e a roda girava num ritmo frenético. ela era o alvo do atirador de facas.