quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Conto do Ipê Amarelo

Berenice andava cabisbaixa. Era outono e as folhas das árvores caiam. Ela não gostava dessa estação... em geral era no outono que as coisas mais tristes de sua vida tinham acontecido. Perdera parentes, perdera amigos, perdera amores. Sempre no outono. Ela não entendia o por quê, mas o fato era que no outono sempre lhe acontecia algo triste. Então ela caminhava devagar para sua casa, quando, ao passar por uma rua que era cheia de ipês por todos os lados, algo lhe chamou a atenção. Ela viu uma pessoa (seria mesmo uma pessoa???) diferente. Diferente era pouco, era uma pessoa mágica. Ela viu aquele ser e não conseguiu se lembrar de como continuar andando, nem para onde deveria ir se conseguisse sair dali. O coração sorriu em seu peito. E sem que ela esperasse, ele a olhou. E foi assim, olhos nos olhos, que se conheceram, conversaram... e toda a história pode ser resumida em um grande amor. Um grande amor que começou no outono, contrariando tudo o que já houvera em sua vida. Bernardo, ele se chamava Bernardo. E não é que até seus nomes combinavam? Berenice não podia acreditar. Estava feliz. E ainda era outono. Eles passaram a estação toda juntos, caminhavam diariamente sob os Ipês-amarelos daquela mesma rua em que se conheceram, enquanto as folhas das árvores caiam sobre eles, como que coroando aquela união. Se amaram ininterruptamente, por meses, até que chegou a primavera. E não deveria ser assim, pois a primavera para Berenice era uma época de alegrias, mas Bernardo olhou no fundo de seus olhos e disse que não podia mais continuar, que ele não sabia mais o que estavam fazendo juntos e que aquele romance não fazia mais sentido. Berenice ouviu. Berenice aquiesceu. Calou. Chorou. O que mais ela poderia fazer? Não disse palavra, apenas olhou... e Bernardo ia longe, caminhava, tranquilo, como se tivesse acabado de puxar um band-aid de um machucado e a dor já tivesse passado. Ele caminhava, caminhava... e a cada passo ficava mais longe... e Berenice apenas olhava seu amor mitológico partindo, para sempre... e o nada...
Enquanto Berenice fitava atônita o fim de seu romance, começaram a cair as pequenas flores amarelas dos Ipês, formando uma aura dourada ao seu redor. Era primavera.





PS1: este conto foi publicado pela Câmara Brasileira dos Jovens Escritores na Antologia de Contos de Outono, em abril, e agora foi escolhido como um dos melhores contos do ano, por isso, achei válido publicá-lo aqui.

PS2: obrigada aos que me acompanham e um Feliz Natal à todos!










2 comentários:

Glauber Vieira disse...

Bom, pelo menos ela percebeu que o outono poderia lhe dar alegrias, mesmo passageiras. Gostei muito, e acho que o encerramento foi particularmente poético.

Graça Carpes disse...

Parabéns!
Belo conto de outono, repleto de primavera.
;)