segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O Violino

Tinha um violino.
Não aprendeu as principais técnicas de execução das obras clássicas, que amava tanto.
Havia pulado a escola de música.
Existe sem dúvida certa semelhança de linguagens simbólicas, entre a música e a poesia.
O som também é um fenômeno físico. Mas o rapaz não foi feito paras as artes melódicas.
Ainda assim, de vez em quando, tocava um milagre com seu instrumento. 
Depois, precisou de dinheiro. Vendeu pra seu amigo, que era melhor violinista.
O violino virou variável quântica.
Quando mirado sobre a estante, colapsava na forma de uma lágrima.
Quando desviava o olhar, readquiria a impossibilidade da ausência.

domingo, 27 de novembro de 2011

Lacrimália
















líquido o

dia

escorre

será de

tristeza

ou

alegria

a lacrimália

do

dia

?

      - Graça Carpes -

sábado, 26 de novembro de 2011

Um pulo

Todos os seus problemas
Laçados
Pela corda sarnenta.

Na firmeza da árvore
A segurança
Que não se encontra em todo o resto.

A garganta amarga
Por arrotos
De rancores e álcool
Agora está apertada
Num nó que não é seu.

As esperanças por um futuro melhor?
Não perduraram ao fim de ano da Globo.

Os sinos não se dobram
Mas as maritacas fazem alvoroço.

Um pulo

Acabou.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Melodia pura




É uma pureza desmedida, transbordada num tilintar íntimo dos corações. Dá para sentir no ar a essência tremeluzindo como uma luz irradiando a escuridão. É apenas doce, suavizado em momentos ternos, incapazes de serem descritos, muito menos compreendidos. É volúpia de inverso deitadas no verso da ternura branda do querer, que penetra delicadamente, aflorando no peito sonhos de verão, regalos de vida na totalidade das emoções. É uma sensação cristalizada no finito alcance dos olhos, amansada no alcance infinito do coração. 

É possível nem mesmo notar e ainda assim sentir. É um mistério tão imenso quanto o universo e tão brilhante quanto a luz das estrelas. É como uma pluma a sobrevoar campos floridos, arrebatando a essência pura imersa no ar, para pousar sensibilidade somente por estar. É um afago delicado, presente na meiguice de um sorriso. É um sonho roubado para ser vivido. É um misto de calmaria e ansiedade; uma intensa magia que sustenta os sonhos mais afetuosos e alicerça os pedaços do âmago da alma. É um vento brando que acalenta a pele, que acolhe o calor das brisas e repousa calidamente no mais íntimo, sem pedir licença. 

A exuberância das sensações alimenta a chama mais tenra presente no coração, realinha a órbita do universo interior e concede esperança onde só tinha dor. É uma implosão de amabilidade, adornada com pérolas translúcidas de indelével querer. Vive no querer intenso, dentro de uma maresia enigmática, e de cores indecifráveis. Enfeita-se na inocência, distante do mais torpe teor. É uma presença que dorme nas franjas do carinho e reflete no espelho dos olhos, que permite perpetuar-se na aurora dos horizontes, dispersando fragmentos amorosos por todos os pedaços do ar. 

É um enlace de paixão, uma força tenaz, capaz de colocar as pétalas despetaladas no lugar. É um afã incontrolável, vívido numa mansidão calma incompreensível, transparecida em uma incólume sensação de prazer. É uma sensação que vem para infindar delicadeza e afabilidade no peito, e tremeluzir o brilho incessante de uma candura imensurável de contentamento. É um afeto explícito, coberto com uma viçosa nuvem de aconchego. É tudo e ao mesmo tempo nada. É inteiro, mas não tem medida definida. Tem a dimensão que nós queremos que tenha. 

É sinfonia entoada nas tardes de primavera. É canção que não tem letra, mas toca. Não se vê, apenas sente. É amor, melodia pura a ecoar.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O mesmo título de um poema de Konstantinos Kaváfis

Behemoth e Leviathan - tela de William Blake


(e um plágio confesso, evidentemente)


Vencidas as montanhas
eles rumam à cidade.

Quilômetros a serem devorados
e o ar já se torna irrespirável –
um bafo antediluviano
lambendo a pele do campo.

A caminho, calcinando a paisagem,
vão comendo a pata dos cavalos –
mera ilusão para a fome que carregam
sobre o lombo de animais elétricos.

Vencidas as montanhas
eles rumam à cidade.

Distâncias a serem consumidas
e o chão já se comporta mal –
a terra, cortada pela frieira,
expõe a carne de raízes retorcidas.

Em seus rastros, rios nauseados
vomitam sobre o próprio corpo –
peixes abortados à flor da água
oferecem as entranhas às moscas.

Vencidas as montanhas
eles rumam à cidade.

2
E não merecemos nada
além de sermos assassinados.



* do livro Comerciais de Metralhadora

domingo, 20 de novembro de 2011

Beatriz


Nem bela, nem atriz. Beata, tampouco. Um retrato desbotado na parede. E um soneto esquecido num caderno. Aberto e roto.



Márcia Maia


sábado, 19 de novembro de 2011

meu novo emprego

Hoje pedi demissão e resolvi ser assassino profissional.
Sempre tem alguém querendo matar alguém sem sujar as mãos, e eu vou te dizer, eu estou bem afim de matar alguém sem motivo, que não o dinheiro é claro, alguém tem que pagar a luz.
Fui treinar ontem à noite, na saída de um bar.
Um casalzinho foi se agarrar num beco, mas que sorte, dois de uma vez só.
O rapaz eu matei com um tiro, porque era grande e podia me bater.
A garota eu matei com as mãos.
O pescoço dela fez creck.
Barulhinho engraçado.
Estou pronto pra começar.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Desvios oníricos

Interpretações de desvios oníricos
feixes de luzes dispersos e coloridos
confluências cognitivas
manifestas no mito
da lucidez 
línguas de mariposas elétricas
reluzente interno de enredos marinhos
cavalos coragem e redemoinhos
sustentando sutilezas telepáticas
assobio no ouvido e extensão de omoplata
ao absurdo absoluto
absinto minuto
evasivo

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Guerras (poesia visual)

Na guerra entre o primeiro...




...e o segundo general...


... quem perde são os terceiros.












Fonte das fotos: wikipédia

domingo, 13 de novembro de 2011

o pé, a pedra, o mundo e o caminho *

(pro Carlos)

por andar
a pé, drummond
encontrou
a pedra, o mundo.

e a pedra

no meio do vasto mundo
tinha um caminho...


______________________________________________
* Publicado Originalmente nos EcosDiversos
  (Direitos reservados, aqui e lá.)

sábado, 12 de novembro de 2011

Lançamento e Vendas - Colcha de Retalhos


Você está convidado para o lançamento do livro:

Colcha de Retalhos
Rodrigo Domit


     O  evento será realizado no dia 04 de Dezembro de 2011, das 14h30 às 17h, no Bar das Quengas - Av. Mem de Sá, número 175 - esquina com Washington Luiz, Rio de Janeiro - RJ.

     O "Colcha de Retalhos" foi finalista do Prêmio SESC (2008) e foi vencedor do Prêmio Utopia (2010). A obra reúne 73 textos curtos e, apesar da predominância maciça dos contos, escapa em alguns momentos para a poesia e para a crônica. A obra está sendo lançada pela Utopia Editora - com projeto gráfico da ilustradora Laís Brevilheri - e quem quiser levar um exemplar para casa desembolsará a quantia de R$10,00.

Conto com a sua presença!


Clique na imagem para ampliar



Venda Online:

Cada exemplar custa R$10,00, o frete é gratuito para todo o Brasil* e são aceitas as seguintes formas de pagamento:

Deposito bancário - Cartão de crédito (à vista sem taxa ou parcelado com taxa de 1,99% a.m.) - Débito online - Boleto bancário (taxa de R$1,00)
*Promoção válida até o dia 04/12.
*O frete para outros países será orçado após solicitação de compra.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

AEIOU



Andava atarefada, aspirava ascensões, agora, às alturas ambicionava.

Esse emprego era espetacular, enfatizava ela, era excelente escritora.

Ideias infinitas, inspirava inúmeros indivíduos, indiscutivelmente imortalizariam-na.

Obra original, ótima ortografia, obtivera ofertas, onde outros obscureciam.

Ufanava-se,  uma ultriz, ultrajou ultraconservadores, ultrapassara uma utopia.


Joakim Antonio

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Memória

Não me apeguei a nenhuma promessa, a nenhum beijo, a nenhum cheiro. Não lembro a cor dos olhos, dos cabelos, a temperatura da pele, o perfume. Me lembro do falar, como se tudo não passasse de uma tragédia cômica, e do medo de uma desobediência. Me lembro da caligrafia, da vergonha dos erros de português, do sorriso, sinal de fraqueza escondido por trás da hostilidade. Me lembro do que só eu via. Me lembro do sadismo das certezas. Da aceitação dos dogmas. Me lembro do valor dado ao dinheiro e a todas as coisas materiais. Me lembro de um amor pela arte escondido, inalcançável. Me lembro dos cutucões no cantinho do pé, da sinceridade da bebida, da violência da dúvida. Da agressão que esconde a timidez. Me lembro de todos os passados, das mortes, da dor do abandono. Me lembro do cuspe, das marcas no rosto e nos braços, do chão, das baratas, do mato, do céu infinito sem estrelas, das mãos dadas, do abraço parado no tempo. Me lembro das flores, das rosas jogadas no rio. Me lembro da perseguição, dos pontos de ônibus vazios de madrugada, do frio, do desprezo, da apatia. Me lembro do reencontro, da aproximação silenciosa, da percepção do fim. Não sinto saudades, mas me lembro de tudo; como dádiva e maldição.  

terça-feira, 8 de novembro de 2011

TOP

Linda, 
nariz empinado, 
encarou as vitrines, 
não olhou para os preços, 
rica, 
olhar de modelo na passarela.

Elegante,
batom e biquinho, 
desfilou pelo espelho, 
não olhou os defeitos, 
magra, 
rostinho de modelo de revista.


Sensual,
lânguido rebolado,
atravessou a avenida, 
não olhou para nada,
fina,
corpinho de  modelo atropelada.

Isaac Ruy 

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Outras Confidências




Não sou funcionário público,
Tampouco tive gado, ouro e fazenda.
Na parede, nenhum retrato
Resgata-me da profusão sentimental
A inflar saudades em meu peito.

Vivo submerso em sonhos e retalhos,
histórias e improvisos;
a tristeza aqui dentro instalada
é amálgama de ferro corroído.

Se eu trouxesse todas as prendas exemplares,
Todas as notas de canções já esquecidas
Transmutava essa tristeza descerrada
Em completa explosão de alegria,

Mas, por hábito, abracei o sofrimento,
isolado mergulhando em noites brancas,
de outros tempos da vida erigi lembranças
que se esvaem simplesmente em contradança

De tão porosa a alma está incomunicável,
ferido o orgulho
maquiado qual ferrugem
de tanta mágoa
me encerro em outra pauta
escrita apenas da alegria que em falta.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

as costas e o coque da moça

Dorso reluzente

Aveludado

À mostra

Com a ajuda dos cabelos presos

Em

Forma de coque

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

A morte como prato do dia

Num curta-metragem assistido em uma mostra de cinema aqui na região a verdade se mostrou mais crua do que nua: vivemos um tempo de relação íntima com a morte. Mas não a natural, que vive perto de cada um e ninguém quer pensar na sua existência. É a morte brutal, chocante, que tem a ver com a desvalorização da vida a que chegou a sociedade tecnológica, esta morte que ronda como um espectro nosso pensamento.
Basta acordar e tomar conhecimento do que andou acontecendo no planeta para se convencer de que a morte violenta é um dos males do século. Talvez nem tanto doenças, pois mesmo com as incuráveis hoje é possível conviver anos a fio; nem tanto a desmoralização política, incapaz de se ocultar aos nossos olhos como antes. O que agora nos assombra são os homens-bombas explodindo em algum lugar; são os assassinatos cotidianos em nossas cidades, mesmo nas pequenas e não mais pacatas; as grandes catástrofes que muitas vezes poderiam ser amenizadas, voltasse o homem a ter com a natureza o entrosamento ancestral, de respeito e até mesmo reverência.
A arte, em todas as suas formas, precisa estar comprometida com o seu tempo. Mas deve apenas lhe servir de espelho, refletindo fielmente sua deformidade com o objetivo de um insight nos muitos alienados, ou reinventá-lo – Cecília Meireles afirmou que “a vida só é possível reinventada” – com outras formas, tintas e leituras, levando o indivíduo consciente a uma possibilidade de reversão do atual descrédito em relação à humanidade? Refletir a questão é como estar no meio de um labirinto, com um monstro faminto à espreita. Algo necessário, porém, pelo próprio instinto de autopreservação.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

derradeiro

finda com o beijo
na testa ou lá
à beira impotente
o desejo que guardava sem mim
morde a fronha e sonha
que decadente!

consuma urgente
meu cheiro de jasmim
e seja encontro
de delicadezas do desamar
que de tanto amar-te,
tonto amar-te,
mar morto, náufrago

e saiba que enjoada, cá
navegarei, navegarei
meio descontente
com o que sobrou

mas, já vai tarde
tarde!