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Permiti minha vida às ruas da cidade. Febre avassaladora movendo minha percepção pelo sombrio corredor humano: dínamo diabólico nos sugando para as polaridades obscuras do nada; Caronte, imenso imã escondido debaixo das montanhas ao norte do paraíso, ou de qualquer coisa impossível, nos atraindo como pequenos parafusos – as moedas sobre nossos olhos, os marcapassos, o ferro em nossas veias, nossos pensamentos de chumbo sobre a morte debaixo dos pneus dos carros ou da vida voando e cagando estanho derretido sobre nossas cabeças.
O corpo fechado, incapaz de conter o halo de ira que escapa pelos poros, ilumina o dia, se confunde com o néon das fachadas das lojas, se mistura aos faróis dos ônibus e se perde entre o clarão do fósforo riscado.
Permiti minha vida à correnteza de carne humana escorrendo pelas vias da cidade: as idéias coletivas sobre qualquer coisa dispensável se misturando num único cardume que é devorado mais adiante, para renascer novamente após a travessia da rua. Alguém que chora passa despercebido, ainda que destoando da desarmônica orquestra magistral. Penso: “era o que todos estariam fazendo se os sapatos não ditassem o ritmo frenético da metrópole e as pernas insistissem em devorar o caminho”.
Sobre minha cabeça, reclames do tráfego se mesclam aos sinais invisíveis dos celulares, às ondas do rádio e da tv, que se unem antes de comunicar aos homens a necessidade da pressa e do temor.
Mais tarde não haverá mais minha vida, porém a cidade prossegue. Ergo o controle-remoto e mudo de canal.*Caros amigos, o romance está prontinho, aguardando uma boa oportunidade para aparecer.
Abraços!
Um comentário:
Oi, Rafael.
Que chegue logo... Aos olhos do mundo!
Bjs
:)
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