
Cristo de Robert Lee Jones
Problemas da poesia contemporânea, parte 1
Não é de hoje que a poesia tem se distanciado do público leitor. Não bastasse vivermos num país que pouco lê, há ainda, por sua vez, uma onda de poetas tomados de aversão ao leitor. O problema é sistêmico. Não há verbas para educação. Para a cultura, muito menos. A iniciativa privada, iletrada, dotada da visão mais selvagem do capitalismo, está disposta a colaborar em troca de lucros, de marketing, de maior visibilidade diante da opinião pública. A poesia que não vende, que não pode ser alvo da mais-valia, vai perdendo espaço para a auto-ajuda, sobretudo a místico-empresarial, para a vernissage produzida sobre encomenda para a coluna social – abstratos prêt-à-porte, enfeites para sala e cozinha; reminiscências pequeno-burguesas sobre os ares da Dysneilandia, e a exaltação do estado de tolerância zero nas mãos de Rudolph Giuliani.
O apego formal, a busca de uma construção rigorosa, a abolição dos sentidos, do discurso, são partes importantes no processo que está em curso e que visa tão somente expulsar a poesia da vida das “pessoas comuns”. A poesia deixou de dizer algo, para se tornar algo. Artigo de luxo, incompreensível, que tem por finalidade ser objeto de admiração para iniciados. Numa sociedade que abole o lúdico e que trancou Dionísio no porão, a poesia feita de poetas para poetas é um experimento laboratorial com um fim em si mesmo. Não serve para nada, a não ser como experimento laboratorial.
O que mais soa constrangedor nessa pretensa “nova poesia” é a aura que se defende de novidade. Não há nada de novo no front. É, quando muito, mais um retorno ao passado clássico, como houve com o Arcadismo, com o Parnasianismo, com a Geração de 45, e assim por diante. Hoje, o foco escapa “do que se diz” sendo de importância apenas “como se diz”.
Por outro lado, é bom ressaltar que não se trata – não nos enganemos – de um culto ao hermetismo de Salvatore Quasimodo ou Marllamé. Ainda que haja, sobretudo a respeito de Marllamé, uma enorme veneração, essa safra de poetas está mais próxima do acaso criativo de Jackson Pollock. Marllamé, como já foi devidamente observado por José Lino Grünewald, era antes um “autor exigente” a um “autor difícil”. O que temos no ar viciado dessa nova safra são autores apenas difíceis. Não possuem o trabalho de signos de Marllamé, muito menos a lapidação que possa revelar a idéia escondida no fundo do poema. Grosso modo, a estética – dos cosméticos – impregnou as páginas dos livros.
Retirar os méritos do Concretismo, por exemplo, ao ambicionar expulsar o elemento discursivo da poesia não é o caso. Até mesmo porque há, nessa ousadia, um momento onde o verso foi repensado. A possibilidade do debate, a abertura da discussão é sempre válida. Sobretudo no tempo onde impera a visão unilateral da mídia e a exaltação do monologismo dos sectários. Mas crer que a experiência concretista é o modelo único e correto já é outra coisa. Filiando-se a uma tradição de pensamento, o autor estará, por sua vez, excluindo as possibilidades de outras tradições. A experiência de vanguarda, nesse caso, é ainda útil e legítima, desde que diluída, assimilada a outras possibilidades.
O mundo é novo a cada segundo. A velocidade das mídias, o intercâmbio de culturas só exigirá uma poesia nova, que esteja a par de tais mídias e compreenda a dinâmica desse mundo. Mas o que se tem é uma poesia artificial, que flutua dentro de uma bolha de isolamento, respirando apenas nas páginas dos dicionários, nos manuais de transgressão etimológica. Já é mais que sabido que a “poesia destituída da realidade social não vale mais que um saco de alpiste”, como já foi dito no Manifesto Potencialista.
A incapacidade de compreender o mundo, ou o que Marx chamaria de auto-alienação, pode explicar essa onda de poetas que acreditam que Fukuyama estava, em absoluto, correto ao decretar o fim da história. O mundo está pronto e compreendido, e o capitalismo já é um estado permanente e irreversível. Resta então, para esses, uma poesia que não esteja vinculada com o que acontece a sua volta, posto que nada, em tese, acontece.
Convén voltarmos a Marx, que demonstra que não basta, por sua vez, simplesmente interpretar o mundo, e sim modificá-lo. Mas isso já seria pedir demais para uma geração que voltou ao vaso grego, vazio.
***
CONVITE!

“A revolução trará não somente direito ao pão, mas também à poesia”
Trotsky
Camaradas, Diovvani Mendonça, do blog Poeminhas para matar o tempo e a dor de dente http://www.diovmendonca.blogspot.com/ está a frente de um projeto muito bacana, que se chama Pão e Poesia.
O objetivo deste é publicar autores novos, nos saquinhos de pão. A loucura poética circula inicialmente na cidade de Contagem, na grande BH, com tiragem de 300.000 embalagens!
O movimento recebeu adesões importantes. Há uma forte participação de autores portugueses, que levarão a idéia para as padarias lusitanas.
Quem sabe o próximo passo não seja lutar para incluir livros na cesta básica?
Interessados podem enviar os seus poemas - até 30 de novembro - para o seguinte e-mail: pao.poesia@yahoo.com.br Os trabalhos selecionados serão impressos em embalagens de pão distribuídas por toda a cidade!
Abraços e bom café da manhã a todos!
*