Havia um menininho ali, parado. Observando o dia como ninguém nunca o fizera. Parecia compreender ou ver o que ninguém tinha visto antes. Era um menininho de olhos grandes, lacrimejados e corpo franzino, e era belo por isso. Por ser ele, peito intumescido, boca ávida, lágrimas estancadas em olhos imensos e negros... imensos olhos com íris negras.
Ele não parava de olhar o vão do dia, apenas via o que ninguém via. Havia certeza em sua visão, verdade maior que o tempo que se exauria e ninguém mais. Ele era só um menino sem educação, mas único, cheio de mundo e de sutilezas na porta de uma casa de barro ornada de flores, flores lindas e vermelhas num contraste límpido com sua pele preta e tenaz. Sob o forte sol do meio dia e o pó das ruas descalças.
A janela de madeira corrompida, entreaberta e o portal denunciavam cupins deixando explícita a harmonia entre aquele menininho, sua mãe e seus amigos. Amigos noturnos que não presenciavam o dia. Mas lhe traziam sonoridades para o seu ninar cansadinho e fúlgido na noite que de vazia nada tinha.
O menininho escapuliu um riso tímido dos lábios ávidos. Trouxe alegria da alma que enxergava a vida no vão. Fantasiou o dia obstante como água de chuva em dia de verão. Fez chover nos olhos a incerteza do estado presente entre a esquina e sua casa à esquerda da Rua das Flores no Bosque das Emas depois da curva inesperada do esquecimento. Lá... naquele dia, no começo da tarde.
3 comentários:
Uma visão aprofundada do pensamento infantil... Quem disse que os infantes não questionam? Gostei, tem lirismo isso...
ficanapaz
Tulio, e era apenas um começo de tarde, de onde as coisas começariam acontecer - a uma ponta de esperança atravessando o texto! Gostei desse retrato poético/histórico. Dessa reconstituição da vida de um menino que vê além das coisas do dia-a-dia - me parece que eles sempre enxergam além!
Queria poder imprimir essa força que você tem, Túlio. Adorei.
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