segunda-feira, 16 de julho de 2007

O Mundo é Delas

Foi após a 5ª Guerra Mundial. Apesar de ter recebido essa denominação, o conflito não envolvera todos os países do mundo, mas apenas aqueles com poderio militar suficiente para apagar da história toda a humanidade, em todos os cantos do planeta. Isso acabou sendo alcançado, incluindo na destruição eles próprios, o que possivelmente não havia sido planejado...
Enfim, as próximas cenas se passaram após esse conflito atômico que destruiu toda a humanidade e boa parte dos animais. Os únicos sobreviventes foram as baratas, que agora tinham como companhia apenas o reino vegetal.
O mundo era um rascunho do que o homem promovera nos últimos séculos. Arranha-céus, estradas, ferrovias, maquinários, tudo isso ainda existia, mas iam aos poucos sendo absorvidos pela natureza ao redor, que dia após dia avançava a vegetação para as cidades. Em algumas só se via agora o verde, interrompido em pontos isolados por um ou outro prédio mais elevado, ainda não alcançado pelas árvores.
Aeronaves, caminhões e veículos há anos estacionados em pátios ou ruas viravam verdadeiros fósseis de aço.
Os velhos depósitos de lixo desapareciam à medida que o tempo tratava de absorver no solo o antigo esgoto da humanidade, ou seja, plástico, latas, pneus velhos, eletrodomésticos quebrados e papel, muito papel. Os restos de alimentos já há muito tempo não existia, boa parte deles consumidos pelas próprias baratas.
O lixo acumulado no fundo dos rios aos poucos desaparecia e a erosão em suas margens também sofria o processo inverso.
No céu das antigas cidades não se via mais o cinza, mas o verdadeiro e límpido azul celeste.
Foi então que duas velhas baratas, andando por aqueles verdejantes caminhos, rememoraram os anos passados que o tempo não traria mais. Passaram ao largo de um córrego de água límpida, que ao tempo delas praticamente secara por causa do excesso de lixo em seu curso; depois seguiram por uma trilha na mata, onde naquele tempo havia um beco com um filete de esgoto a céu aberto que o acompanhava. Por fim, chegaram em um antigo lixão praticamente coberto de arbustos e flores, lugar onde antes se acumulara toneladas de entulho e onde hoje abrigava apenas uma ou outra latinha de alumínio que não teria vida longa. O parque dos sonhos da infância das duas não era mais o mesmo...
O mundo já abrigava a 265ª geração de baratinhas pós-conflito mundial, geração esta que não chegara a conviver com o ser humano, visto entre muitas de maneira quase que lendária, sem comprovação cientifica, algo como a Atlântida ou extraterrestres. É certo que só se passara alguns meses da grande destruição, mas lembremos que o ciclo de vida desses insetos é diferente dos humanos e uma barata, ao contrário dos humanos, pode ser tataravó em algumas semanas...
Enfim, o relato de histórias protagonizadas com os homens era visto por algumas das mais jovens como caduquice das baratas mais idosas. Era o velho conflito de gerações...
Mas as duas companheiras anciãs, de fato, já conviveram com o homem e conheceram o mundo quando os humanos dele faziam parte. E uma delas, ao contemplar aquele ambiente desolador cheio de verde e sem lixo, com gravetos e brotos de plantas a atravessar-lhes o caminho (em vez das latinhas com restos de cerveja ou comida), com lágrimas nos olhos, finalmente exclamou nostálgica e comovida para a outra:
— Puxa vida, que saudade dos humanos!

7 comentários:

MPadilha disse...

É, minha mãe já dizia: Ainda está para ser inventado um veneno que mate baratas. Acho que é o único ser que sobreviveria a radioatividade, rsss . Gostei Glauber, bem pensado. Beijos

Anônimo disse...

Muito boa essa história ao contrário...e parece mesmo que a salvação para o planeta é o fim da raça humana!

Abraços!

Cassio Dias disse...

Parabéns ! Gostei muito !

L. Rafael Nolli disse...

Meu camarada, essa realidade ficcional, atômica, catastrófica, retratada em teu texto pode, infelizmente, ser concretizada! Se as coisas continuarem no pé que estão, não será novidade nenhuma as baratas herdarem esse mundo! Abraços para ti! Bom texto!

Deveras disse...

É... Só as baratas mesmo, para terem saudades dos seres humanos,rs

Gostei do texto cara, viajandão!

ficanapaz!

Larissa Marques - LM@rq disse...

Nós somos o maior e pior predador do mundo! Acabem com os humanos!
Muito bom!

Klotz disse...

Existem cerca de 3.500 espécies de baratas. Apenas meia dúzia busca o convívio do homem.
Para o homem sobreviver ao grande cataclisma autodestrutivo deve unir-se unir ao inimigo e fazer dele rei. Se o homem quiser sobreviver no tempo deve se igualar às baratas da própria cozinha. Já!